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Parceria entre RAMA e Instituto Aus Ouvidos fortalece mulheres e juventudes do Maranhão

Na Agroecologia, cuidar também das emoções se torna ato de resistência


A agroecologia floresce da luta de todo dia de mulheres, jovens e comunidades tradicionais, cuidar da terra e cuidar de quem nela vive são gestos inseparáveis. É nesse caminho que a Rede de Agroecologia do Maranhão (RAMA) e o Instituto Aus Ouvidos deram as mãos, oferecendo escutas pontuais gratuitas conduzidas por psicólogas e psicólogos voluntários, para mulheres e juventudes que integram a Rede e defendem a Agroecologia.


Intercâmbio do GT de Mulheres da RAMA
Intercâmbio do GT de Mulheres da RAMA

As escutas pontuais são encontros únicos e cuidadosamente preparados, que funcionam como espaços de acolhimento, reorganização emocional e reflexão. A metodologia é simples, mas profunda: cada pessoa é convidada a compartilhar sua história, e ao fazer isso, ela se escuta, ressignifica suas experiências, nomeia suas dores, e reconhece que merece cuidado e que tem direito ao cuidado.

“Sem mulheres saudáveis, não há agroecologia”

Ariana Gomes, Secretária Executiva da RAMA e curadora das escutas.
Ariana Gomes, Secretária Executiva da RAMA e curadora das escutas.

Ariana Gomes, Secretária Executiva da RAMA, desempenha o papel de curadora na organização dessas escutas. Para ela, o trabalho de conectar as mulheres e os jovens com o Instituto Aus Ouvidos tem sido tanto desafiador quanto fundamental.

Ariana destaca que, no início da parceria, não se tinha a dimensão exata da situação emocional enfrentada pelas mulheres e juventudes das comunidades. Ela relembra os desafios de mobilizar as pessoas e garantir que compreendessem o propósito das escutas e a importância do acolhimento emocional.

“Organizar as escutas tem sido um trabalho de sensibilização constante. Quando começamos essa parceria, não tínhamos noção da complexidade das situações emocionais que essas mulheres e juventudes enfrentam. A violência de gênero, os abusos, o sofrimento causado pelos agrotóxicos, e os impactos dos conflitos agrários, tudo isso contribui para um quadro de adoecimento emocional profundo.”

A mobilização exige um entendimento profundo da realidade local, e Ariana afirma que, mais do que um tratamento psicológico, as escutas se tornam um espaço de transformação pessoal e coletiva. As mulheres e os jovens que participam, segundo ela, retornam com relatos de mudanças em suas vidas.

“Muitas mulheres e jovens, depois de passarem pelas escutas, retornam e nos dizem que ‘isso me salvou, porque eu estava prestes a cometer algo trágico’. Esses momentos de escuta têm sido verdadeiramente importantes, porque criam um espaço de acolhimento e reflexão, algo que era tão necessário para essas comunidades.”

Ela reforça que saúde emocional e agroecologia caminham juntas:

“Com mulheres sendo violentadas, não pode haver agroecologia. Se as mulheres e os jovens estão adoecidos, como vão continuar produzindo, resistindo, organizando suas vidas? Falar de autocuidado é parte da luta.”

 “Escutar é também um ato político”


Denise Nogueira Abreu, psicóloga e psicanalista com 33 anos de profissão, é presidente do Instituto Aus Ouvidos. Criado em 2020, em  resposta ao cenário de isolamento e adversidades trazido pela pandemia. Com a ajuda de Heber, um amigo engenheiro de software, a plataforma foi desenvolvida para possibilitar escutas pontuais online, garantindo que qualquer pessoa, em qualquer lugar, pudesse ter acesso a esse cuidado, aí cada grupo ou comunidade cadastra um(a) “curador(a)” responsável por organizar os atendimentos, no caso da RAMA, esse papel é da Ariana.

Denise Abreu presidenta do Instituto Aus Ouvidos
Denise Abreu presidenta do Instituto Aus Ouvidos

O que começou como uma necessidade imediata de apoio emocional no contexto da pandemia, logo se transformou em uma plataforma de escuta permanente, onde psicólogos voluntários oferecem apoio a pessoas de todo o Brasil. Para Denise, o conceito de escuta pontual foi cuidadosamente desenvolvido para ser algo mais profundo do que simples sessões terapêuticas.


“A escuta pontual não é um tratamento psicológico contínuo, mas um espaço de encontro, de escuta ativa, onde a pessoa é convidada a contar sua história e, ao se escutar, encontra novas possibilidades. A palavra tem um poder imenso; ela nomeia, contém e ressignifica histórias de vida. A escuta pontual atua como um espaço de transformação tanto para quem escuta quanto para quem é escutado. Essa troca genuína de saberes e afetos, é fundamental para a saúde emocional. Para nós, oferecer escutas a grupos de mulheres e juventudes do campo tem um valor especial.”

Denise também comenta a importância do mapeamento das escutas que ocorre em tempo real, uma ferramenta criada pelo Instituto para registrar as ações de escuta no mundo. Isso permite não só ter um controle da distribuição das escutas, mas também visibilizar a atuação do Instituto e ampliar o acolhimento a lugares que tradicionalmente não têm acesso a esse tipo de cuidado.


“Nosso trabalho é voluntário, mas a tecnologia nos permite expandir nossa atuação para lugares inimagináveis. O mapa de escutas, por exemplo, é um reflexo dessa expansão. Ele permite que as pessoas vejam, em tempo real, onde as escutas estão acontecendo, criando uma rede de apoio e solidariedade, e potencializando o alcance do cuidado emocional. É emocionante perceber que estamos chegando a pessoas que nunca tiveram acesso a esse tipo de cuidado. É criar pontes onde antes havia silêncios. É ver florescer espaços de fala e pertencimento.”

Ela reforça o papel político do projeto e que a escuta ativa é um mecanismo de valorização de saberes historicamente marginalizados:

"Escutar quem cuida da terra, cultiva alimentos e mobiliza saberes tradicionais é um ato político e vital para a ampliação das práticas de cuidado e para o fortalecimento de movimentos sociais transformadores."

A voz de quem viveu a experiência

Conceição Furtado, dentro de uma plantação de bananas em campo agroecológico.
Conceição Furtado, dentro de uma plantação de bananas em campo agroecológico.

Mas nada traduz melhor o impacto dessa iniciativa do que a voz tranquila, feliz e emocionada de Dona Conceição Furtado, agricultora familiar, artesã, quebradeira de coco, diretora e associada da ACESA, conheceu a escuta pontual em um intercâmbio de mulheres da RAMA, em novembro do ano passado. Desde então, tornou-se uma participante ativa, encontrando na experiência um espaço de acolhimento e fortalecimento.


“A partir do dia em que participei da primeira escuta, senti que era algo diferente. Você pode estar com dor, preocupada, mas depois dessa conversa, dessa troca de saberes, a gente se renova. Já são oito meses participando e o mais incrível é ver esses psicólogos que se doam, que tiram tempo para cuidar de outras pessoas."

Para ela, o cuidado não é apenas individual, mas coletivo.

“Quando penso no meu próprio cuidado, estou pensando também no cuidado da outra. Às vezes a gente não tem tempo, mas incentiva as companheiras a participarem. E quando elas conseguem, dizem: ‘Agora não vou perder mais, cada vez que tiver eu vou entrar na escuta’.”

A amizade e a confiança criadas nesse processo também marcaram sua vida:

“O que marcou e está marcando é a amizade, tanto com as pessoas que correm juntas com a gente, que estão na luta, quanto com os psicólogos, como se fossem da nossa família. É Acesa, é RAMA, é Vanessa, é Ariana… são as meninas que lutam, correm, buscam. Isso marca muito, é uma coisa bonita de ver.”

O Cuidado Coletivo e a Força da Comunidade

O trabalho realizado pelo Instituto Aus Ouvidos e pela RAMA vai além da escuta. Ele é um movimento coletivo de fortalecimento emocional, onde a solidariedade e o acolhimento se tornam essenciais para que as pessoas possam resistir e criar suas próprias narrativas de mudança.

“A escuta é um ato de transformação social. Ela cria redes de apoio e abre novos horizontes para aqueles que cuidam da terra, do meio ambiente e de suas próprias vidas,” pontua Denise.

Ao longo dessa parceria, a escuta pontual tem mostrado seu potencial não só para transformar indivíduos, mas para fortalecer as comunidades, criando uma rede de apoio que traz novos horizontes e novas perspectivas para aqueles que cuidam da terra, do meio ambiente e de suas próprias vidas.

“Se queremos territórios livres de veneno e cheios de vida, precisamos cuidar também de quem resiste e semeia futuro,” resume Ariana.

Conheça mais do Instituto Aus Ouvidos visitando este site: https://www.ausouvidos.com/

 
 
 

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